Principais ameaças à fauna piscícola Europeia
Os peixes de água doce são responsáveis por cerca de 40% da diversidade de peixes no mundo e por cerca de 25% de todas as espécies conhecidas de vertebrados. Este grupo de animais é um dos grupos mais ameaçados no mundo, resultado da multiplicidade de pressões a que as bacias hidrográficas mundiais estão sujeitas. Estas pressões têm exercido impactos nefastos nos peixes de água doce, que têm sofrido reduções significativas na sua área de distribuição, muito devido a redução do seu habitat, invasão por espécies exóticas, pesca, poluição e alterações climáticas. Também por causa deste declínio das espécies de peixes, tem sido desenvolvida legislação internacional com o intuito de proteger e gerir as redes hidrográficas Europeias. Digna de nota é a Diretiva quadro da água (2000/60/EC) que tem como objetivo primário atingir o bom estado ecológico de todas as massas de água europeias até 2027 – um objetivo ambicioso mas que já foi revisto, uma vez que a data original para a obtenção deste estado de boa qualidade ecológica era 2015.
A Lista vermelha de espécies ameaçadas da Internation Union for the Conservation of Nature (IUCN) é o maior esforço a nível mundial para avaliar o risco de extinção das espécies tendo em conta as ameaças presentes, passadas e futuras. Analisando as 434 espécies de peixes e lampreias europeias dependentes de água doce avaliadas pela IUCN, foi possível identificar as principais ameaças que afetam estas espécies (Tabela 1). As principais ameaças à fauna ictíica dos sistemas de água doce europeus são: i) barragens e gestão da água, ii) seca, iii) espécies exóticas e doenças e iv) efluentes agrícolas e de explorações florestais –cada uma afetando mais de 100 espécies. Destas destaca-se a ameaça criada pela construção de barragens que afeta mais de 50% de todas as espécies de peixes nativas e quase três quartos de todas as espécies de peixes consideradas como ameaçadas pela IUCN. Estes bloqueios alteram a conectividade natural da rede hidrográfica, levando a uma fragmentação e alteração da dinâmica natural dos sistemas (para mais informação vide A conectividade fluvial em Portugal – I: estado atual – Newsletter APRH nº 158). Este impacto nas espécies de peixes tem recebido atenção da comissão Europeia que incluiu como meta a “libertação” de 25 000 km de rio até 2030 na sua estratégia para a Biodiversidade 2030.
Tabela 1 – Ameaças a espécies europeias de peixes de água doce, de um universo de 434 espécies avaliadas pela IUCN (International Union for the Conservation of Nature). Apenas estão representadas ameaças que afetem mais de 10 espécies de acordo com a avaliação feita pela IUCN. Tabela adaptada de Costa et al. 2021.
Ameaça | Número de espécies afectadas |
Barragens e gestão/uso da água | 222 |
Seca | 147 |
Espécies exóticas/doenças | 146 |
Efluentes agricolas e florestais | 106 |
Efluentes domésticos e urbanos | 58 |
Efluentes industriais e militares | 52 |
Pesca e exploração de recursos aquáticos | 42 |
Vias de navegação | 13 |
Material genético introduzido | 12 |
O quadro pintado neste estudo (Costa et al. 2021), mostra ainda que a situação na Península Ibérica (PI) é mais dramática do que a imagem geral da Europa (Figura 1). A maioria das bacias hidrográficas da PI tem mais de 50% da fauna ictíica com um risco muito elevado de extinção, estes dados são ainda mais preocupantes quando se tem em conta que estas bacias têm uma diversidade piscícola muito baixa, e por isso mesmo uma capacidade potencial de resiliência muito diminuída, tendo em conta a previsível reduzida redundância funcional da comunidade. Portugal tem das redes hidrográficas mais fragmentadas por estruturas hidráulicas transversais da Europa. Para prover uma estratégia eficiente de conservação dos peixes de água doce Portugueses, temos de repensar a nossa estratégia nacional de fragmentação e começar por remover estruturas que estejam degradadas ou cuja função já não seja necessária, devendo-se posteriormente apostar no aumento da conectividade longitudinal, implementado soluções eficientes de transposição das barreiras consideradas essenciais (e.g. passagens para peixes adequadas à barreira e às espécies presentes no sistema).
Figura 1 – Distribuição do número total de ameaças potenciais identificadas para todas as espécies de peixes de água doce presentes em cada unidade hidrológica de nível 8 do HydroBASINS, tendo por base a avaliação feita para a Lista Vermelha de espécies da International Union for the Conservation of Nature, e percentagem de espécies ameaçadas (categorias: Criticamente em perigo, Em perigo, Vulnerável). A legenda mostra o primeiro e terceiro quartil e a mediana. Figura adaptada de Costa et al. 2021.
Costa, M. J., Duarte, G., Segurado, P., & Branco, P. (2021). Major threats to European freshwater fish species. Science of The Total Environment, 797, 149105.